Categoria: Artigos
Data: 27/11/2023
O sofrimento traz à tona o modo de ver - Jó 32-34 

Sinopse 

O sofrimento está por todos os lados. Enquanto você ouve essa mensagem, pessoas estão perdendo suas vidas por um câncer, outras sofrendo algum tipo de violência, sem contar as guerras, catástrofes e tragédias que dizimam cidades inteiras. O sofrimento é tão comum, que muitas vezes nem nos chocamos com algumas notícias. 

Buscamos razões e jeitos para não sofrer. Exercícios físicos, exames preventivos, alimentação saudável, segurança, mas no fim, não há dinheiro nem planejamento que impeçam um luto, uma doença, uma traição, um desastre financeiro, a vida vai além do nosso controle. E quando a tragédia nos alcança, e talvez tenha te alcançado nesse momento da vida, impulsivamente, tomados por tristeza e pela gota de fé que resta, nosso coração clama: Deus, onde estás? 

Contextualização de livro 

Mas isso não acontece só em nosso tempo. A Bíblia nos conta sobre a história de Jó, alguém que viveu o sofrimento em todas as áreas da vida. Apesar de parecer uma narrativa (por retratar uma história), teologicamente, Jó é considerado um livro poético, pois ele é constituído por rimas e métricas poéticas hebraicas e usa muitos símbolos e metáforas.

Na sequência bíblica, temos 5 livros poéticos: Jó - sofrimento; Salmos - oração; Provérbios - questões da vida; Eclesiastes - questionamentos; e Cantares - amor. Isso é importante destacar, porque um livro com gênero literário poético não está preocupado em passar informações sobre tempo e espaço, nem se a história é real ou fictícia. Uma poesia traz reflexões sobre a vida cotidiana de forma poética, com rimas, métricas, que muitas vezes se perdem nas traduções, mas que os questionamentos e afirmações sobre a vida cotidiana transcendem o tempo e espaço.

No caso de Jó, o assunto principal é o sofrimento, e as reflexões poéticas articulam-se entre as causas do sofrimento, quem é o culpado, onde está Deus diante de todo esse sofrimento e o que a resposta de Deus muda na perspectiva de quem sofre. Hoje nós vamos refletir no capítulo 32-34 do livro de Jó sobre o tema: O sofrimento traz à tona o modo de ver Deus. 

1- Nos diálogos das gerações - cap.32 

O livro que vinha de diálogos poéticos de Jó e seus amigos, agora volta ao narrador que relata o sentimento do coração do jovem Eliú. Que aliás, parece estar desde o começo das reflexões do sofrimento, mas só agora, na falta de resposta dos amigos é que ele vai se manifestar. E a primeira coisa relatada pelo narrador do livro é a ira do jovem Eliú, tanto com o Jó que se acha justo como com os amigos de Jó que acham que todo o sofrimento tem uma causa (v.1-3). E um outro motivo dessa ira é que mesmo sem ter mais respostas, eles não procuram colocar o jovem na conversa, pela fala de Eliú, parece que o motivo é por ele ser jovem.

Fato é que os amigos de Jó estão sem resposta e não tentam expandir a conversa para outra geração (v.6 e11). Por sua vez, apesar de estar certo em alguns pontos, Eliú acaba errando quando ele despreza a percepção de Jó e de seus amigos, ignorando todos as reflexões deles (v.12-13). Essa semana eu conversava com uma pessoa que tem acompanhado toda essa série, e ele dizia: “Pastor, eu não entendo porque minha mãe que foi uma pessoa integra está sofrendo em sua velhice e um ladrão pode se arrepender e ser salvo” Como o sofrimento parece nos forçar a sempre pensar somente em duas vias, ou que somos justos demais para sofrer ou que o sofrimento do outro deve ter um motivo moral. Mas essas percepções revelam uma visão rasa da vida.

Se você se acha justo demais para não sofrer, você tem uma visão rasa de você mesmo, você não reconhece e não trata seus erros e falhas, no fim você é omisso. Se você achar que todo sofrimento de alguém tem uma razão moral, você tem uma visão rasa do outro, onde você aponta o dedo, joga a pedra e não demonstra compaixão. Mas isso pode se dar pela dificuldade dos diálogos entre as gerações sobre o sofrimento. Você mais velho ou mais experiente muitas vezes ignora a geração mais nova com o argumento saudosista de que no seu tempo as coisas eram melhores, que a geração de hoje é rasa. Mas ao se deparar com o sofrimento, mesmo com toda sua experiência, parece que as respostas somem, parece que as energias se esgotam.

E então, você joga pra Deus o controle de tudo, afinal, Deus estar no controle é um jeito de aliviar a frustração que sua experiência e sua idade não trouxeram todas as repostas. Por outro lado, temos os mais jovens, que desprezam toda a experiência dos mais velhos. Eles acham que por ter mais informação sabem tudo, por ter mais vigor conseguem tudo. Mas muitas vezes, sofrem porque batem a cabeça em coisas que os mais velhos já viveram, ou entram em crises por falta de enxergar através do olhar dos mais experientes. E então, você joga pra Deus a culpa, afinal, Deus ser o culpado é um jeito de aliviar a sua responsabilidade. Talvez o diálogo com as gerações, ouvir e entender o sofrimento pelo olhar da outra geração, nos ajudaria a ser menos rasos e poderíamos lidar melhor com a dor. 

2- Em nossa relação com ele - cap.33 

Eliú repete as palavras de Jó onde o sofredor se coloca como alguém justo, e que ele não merece passar pelo que Deus está permitindo ele passar. Mas Eliú discorda disso dizendo algo simples: “Deus é maior do que o homem” e Ele tem muitas maneiras de falar, e ele fala com o homem, mas o ser humano não se atenta para o que Deus está falando (v.8-16). O ponto que Eliú destaca é que Deus usa o sofrimento para falar com Jó e por mais que tudo pareça estar perdido, basta um anjo, um mediador, um intercessor, que o ajude a enxergar quem é de verdade, que Deus agirá com graça e ele será resgatado (v.19-26).

Eliú ainda afirma que o sofrimento é o caminho de Deus para resgatar a alma do homem e para que a luz da vida seja o brilho em seu coração (v.27-30). Mas porque o ser humano precisa ser resgatado? Quando Deus criou o homem a sua imagem e semelhança, isso significa que o ser humano brilhava a luz da vida. Mas ao decidir pela autonomia, o ser humano rompe com Deus e todo o caos entra no mundo e o homem corrupto não pode ter mais acesso a vida de Deus, ele precisa de um mediador, de um intercessor. Deus então envia seu filho Jesus para levar nossos pecados, e não só isso, mas Jesus se torna o nosso mediador e intercessor para nos levar de volta para Deus e nos libertar do caos (Hebreus 7.24-25).

É por mediação dele que chegamos a Deus, é pela intercessão dele que Deus age com misericórdia e nos resgata. Assim, duas coisas podemos destacar a luz de Jesus… a) Deus fala de muitas maneiras, nós que não entendemos. Talvez você pense que uma voz estrondosa, um anjo, uma revelação ou qualquer coisa sobrenatural faria você entender melhor o sofrimento, mas a bíblia está repleta de histórias que Deus falou de formas sobrenaturais e as pessoas seguiram por caminhos contrários. Deus já deixou sua palavra para nos orientar, seu espírito fala ao nosso coração, sinais são dados todos os dias. O que precisamos nos perguntar é se Deus não está falando ou ele está falando, mas não é o que gostaríamos de ouvir. b) Deus permite o sofrimento para recuperar nossa alma. Apesar de sermos resgatados pelo sangue de Jesus, nós ainda erramos e muitas vezes nos afastamos da vida de Deus. E infelizmente, o jeito que refletimos sobre os nossos caminhos, atitudes ou palavras é em meio a dor. Pense comigo e questione se suas maiores reflexões não são ou não foram em meio ao sofrimento?

Aliás, possivelmente você só está hoje aqui ouvindo essa palavra porque em algum momento de sofrimento você percebeu que precisava de Deus. O filósofo Luis Felipe Pondé diz: “A melhor fonte de conhecimento é você passar por experiencias de sofrimento e ter alguns recursos para não sucumbir a elas”. A questão é que recurso você usa se você está sofrendo? Jesus é este recurso! 

3- Na ação dele no mundo- cap.34 

Na parte final deste discurso, Eliú vai se dedicar em dizer sobre esse julgamento de Deus que Jó fala tanto. Eliú afirma que Deus não é parcial, ele castiga também príncipes, governantes, autoridades, porque todos são criação e passarão pela morte também (v.18-20). Por último, Eliú faz uma suposição perguntando a Jó que se Jó se arrependesse e não pecasse mais, o que sabemos ser impossível, ainda sim, a partir de uma suposta perfeição, ele deveria ser recompensado por isso? Ele pode exigir algo de Deus? Ele pode se rebelar pelas exigências não respondidas? (v.31-33)

Me lembro de um casal que fez sua viajem para os EUA, tiraram altas fotos juntos, trocando carinhos, sorridentes, e 2 meses depois estavam se separando. Além das feridas da alma, eles estavam cheios de dívidas e querendo arrancar um do outro o que sobrou. Pare de deduzir a situação das pessoas pelo que você vê externamente e com isso pensar que você sofre e o outro não. A pessoa pode estar rica mais com um casamento falido, pode ser uma autoridade mas estar afundado na depressão, ser famoso mas chorar por sentir solidão, não tire conclusões precipitadas Deus é parcial, não, ele não é. Todos são criação e todos passarão pela morte.

Não se rebele pelas exigências não respondidas. Você pode escolher caminhos bons, você pode achar que está fazendo tudo certo (o que já conversamos na mensagem anterior que ninguém pode se garantir integro), mas caso você esteja sendo alguém muito bom para este mundo, ainda sim, você pode exigir que não sofra? “Pastor, estou batizando meus filhos e criando eles no caminho do Senhor para que eles não se desviem”, então, mas não depende só de você, há a experiência deles também, há o tempo deles, pode ser que eles se afastem por um tempo, sejam alcançados pelo sofrimento, para um dia retornarem, mas quem é você para exigir algo?. Pastor, fui batizado e me tornei membro dessa comunidade, então agora vai dar tudo certo né?” Então, uma pandemia, uma crise no país, um filho incrédulo, um cônjuge que trai, pais que não compreendem você, um mundo distante de Deus, nós não vivemos sozinho, então o sofrimento vai nos alcançar. Será mesmo que uma vida perfeita nos daria razão para exigir alguma coisa de Deus? Você é criatura, ele é o Criador, ele é a sabedoria.

Que o nosso modo de ver a vida no mundo possa ser influenciado por Jesus, onde entendemos que Deus é imparcial e que não podemos deduzir que alguém sofre ou não pelas coisas externas. Que nosso modo de ver a vida possa influenciado por Jesus que tenta ao máximo percorrer o caminho de Deus, não esperando exigir algo dele, mas por saber que é o melhor para nossas vidas. 

Minha oração: Que Deus nos ajude a enxergar Ele nos diálogos das gerações, aprender na amplitude das experiências. Que Jesus seja o nosso mediador, intercessor, para nos resgatar, para nos atentar ao que ele está falando, sendo recurso em meio ao sofrimento. Que o Espírito Santo nos ajude a reconhecer o nossa pequenez, nossa visão limitada, a complexidade da vida e a grandeza de Deus.

Autor: Kariston Fiori   |   Visualizações: 306 pessoas
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