
Consumo e mágoa - Jonas 4
Sinopse da série
Diante de um mundo cada vez mais cruel, nossa cultura clama: "mais amor, por favor". O que não ouvimos tanto, é sobre ter misericórdia de quem não merece. Aliás, sendo mais diretos, o que mais nos convencemos é que temos direito de odiar e até sermos cruéis com quem tenha nos traído, nos prejudicado ou até mesmo alguém com convicções políticas diferentes das nossas.
Mas essa realidade não é só do nosso tempo. No livro de Jonas encontramos um profeta com a confrontadora missão anunciar salvação para uma cidade opressora de seu próprio povo. Jonas, porém, só quer que Nínive seja alcançada pelo juízo e que paguem pelo mal que causaram, sofrendo cruelmente.
No fim, mais que uma cidade violenta e opressora ou um profeta teimoso e magoado, o livro de Jonas nos apresenta Deus que, independente do mal causado, estende a mão aos perdidos, confronta o coração dos seus escolhidos e nos leva a conhecer e experimentar "O Deus compassivo”
Contextualização do livro
Jonas ganhou renome como profeta durante o reinado de Jeroboão II1. Seu livro tem sido alvo de discussões prolongadas por conta de suas características únicas em comparação com os outros profetas. Enquanto os outros livros proféticos adotam um estilo mais direto e poético ao repreender e exortar o povo de Israel, o livro de Jonas se destaca por contar uma narrativa que se assemelha a uma história, incluindo elementos como um profeta que tenta fugir de Deus, uma tempestade no mar, um grande peixe que o engole e sua "bem-sucedida" pregação em Nínive.
A essência do livro reside em sua mensagem intemporal sobre arrependimento e a misericórdia divina. Jonas nos recorda que, não importa quão pecador alguém seja, e nem tão longe tentemos escapar da missão de Deus, o Deus compassivo está sempre redigindo a história e expressando sua compaixão a humanidade, é isso que encontramos em Jonas 4.
1- Consumistas e magoados (v.1-3)
Jonas ficou decepcionado com Deus e ele expressa isso orando a Deus.
Interessante destacar que há somente duas orações do profeta relatada no livro, uma oração é para pedir livramento diante da escuridão que o cercava e outra para reclamar do que Deus está fazendo, ou seja, parece que esse detalhe literário expressa uma relação de consumo com Deus (v.1). Jonas sabe que Deus é compassivo por experiência própria, e ele não reclama quando a compaixão é com ele, o problema é Deus ser compassivo com Nínive. Parece que a mágoa de Jonas se torna o termômetro de quando Deus deveria ser compassivo ou não, tanto, que diante da misericórdia com Nínive, o profeta que um dia pediu salvação dentro do peixe, agora clama pela morte (v.2-3).
Há dois tipos de perfis que encontramos em Jonas, nessa conversa com Deus, o primeiro são os consumidores. O que seria uma relação de consumo? Consumistas são aqueles que se dedicam em oração, na palavra, que priorizam as coisas de Deus quando precisam de uma cura, de uma porta aberta, quando precisam resolver problemas que foram criados por eles mesmos. Consumistas só querem Deus pelo que ele pode oferecer. Consumistas também reclamam quando as coisas não saem como eles gostariam. Alguns até dizem: “coloquei Deus na parede!” Eles pensam ser possível Deus se dobrar diante dos seus fortes argumentos.
Mas um segundo perfil são os que eu chamaria de magoados. Eles reconhecem ser pecadores e salvos pela graça, reconhecem a soberania de Deus nas palavras, eles são contra os consumidores, até porque eles não esperam nada de Deus, apensa uma coisa, que Deus condene os pecadores. Eles se reconhecem como pecadores? Sim, mas na cabeça deles existe o outro tipo de pecador, o que merece sofrer e pagar caro. Por exemplo, é o divorciado que alimenta a mágoa com seu ex-cônjuge, isso quando não alimenta o ódio por todos do sexo oposto. É o crente que alimenta mágoa contra uma denominação, isso quando não condena todos daquela denominação. É a pessoa que se decepciona com um determinado político e abraça um lado oposto, fomentando o ódio por todos que compactuam dos ideais que o decepcionou.
Quem você tem sido na relação com Deus? O consumista que busca a Deus por precisar e reclamar ou o magoado que deseja que determinadas pessoas de uma denominação ou etnia sejam condenados?
2- O Deus compassivo (v. 4-5)
Apesar desse coração ressentido e magoado de Jonas, Deus faz uma pergunta para ele. Deus está sendo compassivo com Jonas, levando o profeta a repensar sobre seu coração consumista e amargurado (v.4). Concordo com o Rev. Hernandes quando ele diz que "esta é a segunda vez que Jonas foge do centro da sua missão. Da primeira vez, Jonas fugiu de Nínive para Társis. Agora, ele foge de Nínive para a sua cabana, enquanto poderia estar no meio da cidade, confortando as almas aflitas que corriam para os braços de Deus em sincero arrependimento.”2 O profeta se fecha e fica inerte a missão.
Por que nos fechamos para a missão de Deus com algumas pessoas? Quando Deus cria o ser humano, não existia relação de consumo nem existia a mágoa. Mas quando Adão e Eva decidem seguir sua vontade e não a de Deus, as relações são feridas, o caos se instala. Relações de consumo com Deus e com o próximo nascem, tudo é descartável e a mágoa toma conta do coração humano. Mas Deus se fez carne, e na pessoa de Jesus, mostrou um novo caminho. Enquanto ele é morto na cruz, sem ter pecado algum, ele diz: Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo” - Lucas 23.34; Jesus é a expressão do Deus compassivo, ele tem compaixão até mesmo dos que estão o crucificando. Ao terceiro dia ele vence a morte, ressuscitando e iniciando uma restauração em toda aquele que crê, onde será completo na eternidade.
Assim, não seja inerte ao que Deus está fazendo no mundo. Deus pode estar salvando pessoas que um dia foram consumistas com você, que te descartaram e te magoaram. Deus pode estar trabalhando em pessoas que são magoadas com você e agiram de forma maldosa com você. Ainda sim, em Jesus, perdoe! Essas pessoas estão cegas como um dia você estava. Não se feche em sua tenda, ore por eles e esteja disposto para confortar e consolar quando eles se arrependerem de seus maus caminhos.
3- Seja a resposta (v. 6-11)
Deus usa recursos ilustrativos para mostrar para Jonas como Jonas é alguém que valoriza mais as coisas do que pessoas, para Jonas, uma planta que faz sombra não merece morrer, mas uma cidade toda deve ser condenada (v.6-8). Jonas se alegra com as coisas boas na sua vida mas não se alegra e ainda se ira com o que Deus está fazendo nos outros (v.9). O livro acaba com uma pergunta mostrando que o sentido da justiça e da misericórdia de Deus não se encaixa em nossos conceitos rígidos e preconcebidos, ao mesmo tempo, nos desafiando a ser essa expressão de Deus no mundo (v.10-11).
Precisamos ressignificar o lugar das coisas e das pessoas. Longe de mim sintetizar um assunto complexo como aborto, mas é uma incoerência bíblica as pessoas se moverem e protestarem contra o desmatamento e ao mesmo tempo tratar de forma tranquila que não é um crime um ser humano com 22 semanas de vida ser morto. Ao mesmo tempo, temos uma sociedade que trata cães como filhos mas não se comove com o vizinho que está passando necessidade. Pessoas não ficam sem investir tempo e dinheiro em seus hobbies, mas diz não ter tempo e recurso para servir e contribuir na comunidade. Nós precisamos valorizar mais as pessoas do que as coisas.
Não se ire com as coisas boas na vida dos outros, se alegre. Somos tendenciosos em ficar tristes e até irados com aquilo que Deus está fazendo na vida dos outros, principalmente quando as coisas não vão bem em nossa vidas. Escolha agir deferente, se alegre com o casamento do seu familiar mesmo que o seu não vá bem, fique feliz com a prosperidade dos irmãos mesmo que você esteja nua crise financeira, se alegre com as portas de trabalho que foram abertas na vida de outro mesmo que você está esperando a sua faz tempo. Em vez de ficar desconfiado, criticando, se alegre pela graça de Deus ter alcançado aquela pessoa complicada, que já errou tanto com você.
O livro de Jonas nos ensina que a missão de Deus não se encaixa nos conceitos e preconceitos que adquirimos, a graça de Deus pode alcançar, inclusive, os que nos feriram. Precisamos compreender que, seja uma cidade corrompida, ou um religioso exclusivista, todos podem, e precisam, serem alcançados pelo Deus compassivo.
Minha oração é que nos perdoe pelas relações de consumo e pela mágoa que fomentamos no coração ao ponto de não desejar o perdão de Deus para os outros. Que Jesus nos ajude a perdoar e até sermos instrumentos de Deus para quem nos feriu. Que o Espírito Santo nos leve a ressignificar o valor das pessoas, se alegrando com os que se alegram e sendo a expressão do Deus compassivo.